Os sapiens e o artigo 37 da Constituição de 1988
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Os sapiens e o artigo 37 da Constituição de 1988


Nós, do gênero “Homo” e da espécie “Sapiens”, não somos o resultado de uma sequência evolutiva em que nos precederam os Homo Ergaster, os Homo Erectus e depois os Homo Neanderthalensis, somos espécies diferentes do mesmo gênero, coexistimos, inicialmente, em espaços físicos diversos. Os Neandertais nunca foram os brutamontes que nos disseram, tinham o cérebro maior que o nosso e poderiam ser potencialmente mais inteligentes do que nós. Uma coisa é certa: eles tinham o sentimento de cuidado com o outro, cuidavam amorosamente de seus irmãos de grupo, inclusive dos que apresentavam deficiências físicas, e conviviam harmonicamente com os outros seres de seu habitat natural. Não foram encontradas evidências de que nós, os “Sábios”, fizéssemos isso, ao contrário, abandonamos ou matamos membros de nossos bandos que não conseguiam acompanhar sua marcha.

Ainda não se sabe o porquê mas, surpreendentemente, em nossa espécie, operou-se uma revolução de conhecimento, que nos permitiu falar sobre o que não é concreto. Outros seres falam, mas apenas sobre o concreto, avisar ao bando da aproximação de algum predador específico, por exemplo, entretanto, os Sapiens, desenvolveram uma capacidade extraordinária: falar sobre o imaterial, falar sobre o outro, “fuxicar”. Esta linguagem permitiu que os grupos se reorganizassem aglutinando indivíduos que confiavam uns nos outros, permitiu identificar os traiçoeiros, trapaceiros, os que produziam intrigas, para que sua ação desagregadora fosse neutralizada. Formaram-se grupos mais coesos, consequentemente, mais proativos e eficientes que os precedentes. Tudo indica que os bandos tinham uma população de 50 a 150 humanos, a partir deste número, o desentendimento era insuperável, o grupo se desintegrava e formavam-se novos bandos. O surgimento da linguagem sobre o imaterial mudou esta realidade, permitiu a sustentabilidade de grupos maiores porque possibilitou a criação dos mitos que a todos aglutinava pela crença, além dos objetivos comuns de sobrevivência. O imaterial é instrumento de agregação porque é expressão de identidade interior.

O aumento do tamanho dos bandos de sapiens foi absolutamente intolerante com a coexistência de outros seres. Esses grupos começaram a migrar para territórios exteriores ao seu habitat natural e, estarrecedoramente, logo após sua chegada ao destino migratório, a vida natural desses ecossistemas sofria uma perda desastrosa. A chegada de Sapiens em territórios virgens coincide com a extinção dos animais de maior porte e da espécie humana natural deste novo espaço ocupado por nossa espécie. Ao que tudo indica, nossa presença, foi letal para os Neandertais, para os Erectus, para os Diprotodontes, para os Lêmures-Gigantes de Madagascar bem como para centenas de seres nativos. Isto aconteceu em todos os locais para onde migramos de modo que a teoria de extinção de espécies em razão de alterações climáticas de nosso lindo Planeta não é mais capaz de ignorar esta desconfortável coincidência e, sozinha, não justifica mais a extinção de espécies da fauna e flora Pré-Históricas.

Toda esta História contou-me Noah e parece nos revelar uma importante mensagem para a organização normativo/social do Estado: o homem precisa de instrumentos do Direito, como produto de sua linguagem imaterial, para ajudá-lo a vencer sua incapacidade Pré-Histórica de percepção sistêmica. É esta forma de entendimento da integralidade do existir que possibilita dois resultados fundamentais para a sustentabilidade sócio/política do Estado: a previsibilidade eficiente dos riscos (consequências) do agir imediato e a percepção de integralidade da existência das formas de expressão da realidade na Terra: a vida.

A análise dos referidos elementos Pré-Históricos indica que as demais espécies vivas possuem percepção, por recursos naturais diversos da razão, pois tal habilidade é inerente a formas potencialmente mais inteligentes que os Sapiens, como os Neandertais, e está presente também nos demais seres vivos, potencialmente menos inteligentes, ao menos sob a forma que a entendemos: capacidade de aprender e criar. Induvidosamente, falta a nossa espécie esta habilidade natural que possibilita a coexistência harmônica, somente ela permite a sustentabilidade da estrutura Estatal como grupo humano de proporções numéricas inimagináveis para nossos ancestrais e nunca vividas por eles.

Nos parece que este é o fundamento do artigo 37 da Constituição da República Federativa do Brasil ao estabelecer que as entidades e agentes do Estado somente têm autorização normativa para agir em obediência aos princípios de legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência. Esta norma é arte de nossa habilidade de falar sobre o imaterial, se destinada a suprir nossa incapacidade de autoinserção como parte da integralidade da Terra, é dizer: de embelezarmos o dom da vida. Precisamos realizar este ditame constitucional no dia a dia, para que as gerações mais recentes aprendam a repetir nosso modo de conviver, o ser humano aprende por imitação. Se somos capazes de falar sobre o imaterial, é certo que temos dificuldades de perceber as mensagens imateriais de unidade do existir. Nos disponhamos a cumprir intransigentemente as orientações normativas, imateriais, expressas na Constituição, com a maior eficiência possível, precisamos honrar o distintivo que conferimos a nossa espécie “Sábios” e devemos esta paga de sabedoria a todas as espécies que fomos incapazes de ajudar a partilhar a vida conosco. A tarefa é nossa, aprendamos com os Neandertais!


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